Ayn Rand, o “macarthismo” e os comunistas de Hollywood

Por Elan Journo

Em 1947, durante o que alguns chamam de “Era McCarthy”, Ayn Rand foi convidada a testemunhar diante do Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso (em inglês “House Un-American Activities Committee” – HUAC) sobre a influência do comunismo em Hollywood. Ela foi citada como uma “testemunha amigável”.

O veredito padrão sobre tais audiências, e sobre a participação de Rand, é de inequívoca condenação: As audiências foram uma inquisição que destruíram as carreiras de cineastas postos na “lista negra”, arruinaram vidas, e pisotearam a Primeira Emenda. E as “testemunhas amigáveis”, entre elas Rand, que testemunhou voluntariamente, foram culpadas de cumplicidade com uma caça às bruxas anticomunista.

O único problema com esse veredito padrão é que ele está totalmente errado.

Em seu soberbo livro “Ayn Rand and Song of Russia: Communism and Anti-Communism in 1940s Hollywood”, Robert Mayhew põe abaixo o veredito padrão e esclarece as coisas. Mayhew, um professor da Universidade Seton Hall, é um “scholar” especializado em Ayn Rand e editor de várias antologias de ensaios analisando suas novelas e pensamento.

Questões morais importantes estão envolvidas na investigação do comunismo na Hollywood dos anos 40. Mas, como Mayhew explica, considerando quem “os comunistas de Hollywood realmente eram, quem e o que eles realmente apoiavam, e o que realmente aconteceu nas audiências do HUAC em 1947, a imagem popular do episódio é totalmente sem sentido.” Profundamente e meticulosamente pesquisado, o livro fornece o contexto essencial para analisar o envolvimento de Rand no HUAC e a verdade sobre o comunismo na indústria de filmes.

Antes de concordar em cooperar com o Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso, Ayn Rand refletiu cuidadosamente quanto ao seu propósito e utilidade. Ela depois refletiu sobre sua própria experiência e analisou as críticas levantadas contra o HUAC. Mayhew nos oferece um quadro detalhado sobre como Rand enfrentou as questões morais e legais relacionadas às audiências.

O livro cita, sem nada cortar, notas tiradas do próprio diário de Ayn Rand, nas quais ela colocou, para sua própria compreensão, as objeções levantadas contra o Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso e àqueles que, como ela, depuseram como testemunhas amigáveis. O HUAC estava investigando não “uma questão de opinião, mas uma questão de fato, o fato de serem membros do Partido Comunista,” o qual era dirigido e financiado por uma potência estrangeira. Os objetivos do partido, segundo o próprio, incluem atos de violência criminosa. Então, quando o Congresso investiga o partido, trata-se de esclarecer os fatos sobre suas atividades criminosas, não se trata da ideologia que move o partido. Tampouco, Ayn Rand concluiu, era moralmente errado para indivíduos, associações ou empresas privadas fazer uma “lista negra” de pessoas reconhecidas como membros do Partido Comunista. Tal “lista negra” é um boicote privado, não uma ação pública punindo pessoas por suas crenças e nem um caso de censura.

Havia um problema real de infiltração e influência comunista em Hollywood, mas as audiências, Rand concluiu, eram em geral fúteis e na melhor das hipóteses meios para divulgar a questão ao “chamar a atenção para a conspiração que estava acontecendo”. Ela tinha uma sombria visão dos membros do comitê, considerando-os como um “bando de tolos, completamente por fora da situação”. Mas, ao contrário da opinião geral, Ayn Rand não via as audiências como “algum tipo de interferência nos direitos de alguém ou na liberdade de expressão”.

Mayhew nota que Ayn Rand era especialmente qualificada para comentar sobre o comunismo em Hollywood. Ela tinha testemunhado a Revolução de 1917 na Rússia, ela tinha experiência própria com os comunistas no poder, e ela tinha trabalhando como roteirista em Hollywood.

Qual foi a essência do testemunho de Ayn Rand perante o HUAC?

Ayn Rand concluiu que era importante expor não somente o fato que membros de carteirinha do partido comunista trabalhavam em Hollywood, mas também que eles estavam enxertando propaganda pró-soviética nos filmes. Mayhew observa que parte dos objetivos de Ayn Rand ao testemunhar era deixar claro que “ditadura – e naquele tempo isso significava acima de tudo a União Soviética e o Comunismo – é má, perigosa e contrária aos interesses e princípios fundamentais da América.” Apesar de suas expectativas, na audiência ela só foi interrogada sobre um único filme, “Song of Russia”. Mayhew usa este filme pró-soviético, escrito principalmente por membros do Partido Comunista dos Estados Unidos, como um estudo de caso, para iluminar tanto o testemunho de Ayn Rand quanto o comunismo em Hollywood.

O livro de Mayhew fornece uma meticulosa análise do roteiro de “Song of Russia”, um sumário do filme concluído, e um exame detalhado do testemunho de Ayn Rand (que é também reproduzido integralmente, como um apêndice). O livro mostra os pontos chaves no testemunho de Ayn Rand sobre os elementos de propaganda no filme e os considera levando em conta fatos documentados sobre o regime totalitário da União Soviética. Por exemplo, “Song of Russia” retrata a vida numa aldeia da URSS como cheia de alegria, com fartura de comida, e propriedade privada de tratores, mas a realidade era brutalmente diferente. A URSS tinha imposto pela violência uma política de coletivização agrícola, erradicando a propriedade privada, e deliberadamente causando uma grande fome para eliminar uma classe inteira de fazendeiros. O estranho retrato cor de rosa que o filme faz da vida na aldeia serviu para glorificar o sistema comunista.

Uma analise aprofundada de Mayhew justifica o testemunho de Ayn Rand. O filme “Song of Russia” surge como um trabalho cheio de propaganda pró-soviética..

E no entanto é Ayn Rand (e outra testemunha amigável do HUAC) que e denunciada como uma vilã. Por que? Muitos dos que simpatizam com os “Dez de Hollywood” — um grupo de cineastas que se recusaram a cooperar com o HUAC — têm condenado o testemunho de Ayn Rand. Mayhew analisa suas críticas.

Elas são um estudo de caso em matéria de distorção e desonestidade. Mayhew comenta:

“Não apenas eles [os críticos] estavam desinteressados pela real natureza da Rússia Soviética, eles ignoram muito do que Ayn Rand disse – o conjunto de seu testemunho ao HUAC – e distorcem o que não ignoram. Eles utilizam a mesma metodologia dos soviéticos, ou seja, eles aceitam que se pode muito bem ignorar e distorcer os fatos se isso ajuda a alcançar um fim esquerdista, nesse caso vilificar o HUAC e uma famosa anticomunista e pró-capitalista.”

Com impressionante uniformidade, da mesma família que a “linha do partido”, muitos críticos focalizam numa observação casual que Ayn Rand fez em resposta a uma pergunta sobre se as pessoas sorriem na União Soviética. Posta em seu contexto, como Mayhew mostra, o que ela quis dizer é que os russos não sorriem abertamente e em aprovação ao sistema totalitário que os esmagava. Mas sua observação tem sido distorcida e transformada numa declaração de que os russos nunca sorriam e tratada como se essa fosse a essência de seu testemunho. Pela implicação de que o testemunho de Ayn Rand era um absurdo autoevidente, os críticos obscurecem o conteúdo completo do que ela disse para tirar o foco da verdade sobre o totalitarismo soviético.

Resumindo, como Mayhew observa:
“‘Song of Russia’ – de qualquer forma, um típico filme bobo de Hollywood – é uma fraude que desonra esses milhões [de pessoas tiranizadas e assassinadas pelo regime soviético]. Mas muito pior do que ‘Song of Russia’ são os esquerdistas que também desonram esses milhões, enquanto caluniam uma grande mente por sua tentativa de mostrar a versão verdadeira dos fatos.”

O livro destaca uma outra, ainda que menor, inversão moral na visão popularizada, quanto à alegação que os cineastas postos na “lista negra” perderam injustamente suas carreiras. Na verdade, há motivos para acreditar que alguns comunistas apesar disso foram capazes de voltar a trabalhar em Hollywood com nomes falsos, graças as suas conexões. Pior ainda, alguns são celebrados como heróis e glorificados em filmes populares. Mas houve inocentes vítimas cujas carreiras foram arruinadas em consequência das audiências do HUAC. Há relatos críveis que algumas das testemunhas amigáveis – atores, roteiristas – foram realmente excluídos e impedidos de trabalhar novamente em Hollywood.

Embora as audiências do HUAC sejam algumas vezes incluídas na “Era McCarthy” – pavimentando o caminho para acusar Ayn Rand e outros participantes com a acusação de “macarthismo” – isso é tecnicamente incorreto. O senador Joseph McCarthy não teve envolvimento no HUAC, que foi formado em 1938. Ayn Rand testemunhou em 1947. McCarthy começou suas investigações em 1950 e se concentrou na infiltração comunista, não em Hollywood, mas no governo americano.

Além do mais, embora Ayn Rand não fosse admiradora de McCarthy ou de seus métodos, ela logo percebeu que o termo “macarthismo” era um conceito ilegítimo, concebido como uma deliberada vilificação. Seu suposto significado seria, ela escreveu, “acusações injustas, perseguições, e assassinatos de reputações de vítimas inocentes.” Mas ela argumentou que seu real significado era “anticomunismo”, e a distorção tinha o objetivo de desacreditar como necessariamente injusta e irracional qualquer oposição inflexível ao Comunismo.

O veredito geralmente aceito sobre o HUAC e sobre Ayn Rand é praticamente uma feroz condenação, desconsiderando os fatos, o contexto histórico, a real natureza da infiltração comunista e o significado moral desta ideologia. É uma caricatura da realidade, que foi tomada como base para pensar e avaliar estas questões.

Em contraste, o livro de Mayhew é um modelo de como esclarecer e analisar do princípio ao fim as questões relacionadas à infiltração de comunistas nos anos 40 em Hollywood. O livro não é apenas um ato de justiça para Ayn Rand e outras testemunhas amigáveis. É também, mais amplamente, um ato de justiça para as vítimas do regime soviético, que agonizavam enquanto os comunistas em Hollywood embelezavam seus opressores soviéticos e trabalhavam para promover essa perversa ideologia.

Nas audiências da HUAC e ao longo de sua carreira, Ayn Rand falou claramente sobre os males da ditadura e coletivismo, em todas as suas formas. Ela estava certa em agir assim.

 

Publicado no New Ideal, do Ayn Rand Institute, com o título “Why Rand was right to testify against Hollywoood communism“.

Tradução: Flamarion Daia

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