Rússia: Eurasianismo, influências esotéricas e a morte de Daria Dugina

Por Luis Dufaur

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Militante eurasianista saúda Aleksandr Dugin durante o funeral de sua filha, Daria Dugina, morta em um atentado a bomba em 22 de agosto, nas imediações de Moscou.

O jornalista e cientista político Sergej Sumlenny que desempenhou importantes missões na mídia russa e alemã e escreve para a maior revista russa de economia sublinhou quanto o esoterismo é difundido na Rússia, especialmente entre as elites.

Para ele, o exemplo mais recente apareceu nas explicações da morte de Daria Dugina, filha do filósofo Aleksandr Dugin – preferido de Vladimir Putin e intensamente relacionado com o ocultismo que subjaz em não poucos movimentos populistas e enganosamente “tradicionalistas” ocidentais.

O site independente Atlantico, que foca com frequência a Eurásia putinista, e os novos movimentos populistas europeus afins, lhe perguntou sobre a hipótese de que a morte de Daria Dugina teve um motivo esotérico.

Sergej Sumlenny disse acreditar que a explicação mais realista do assassinato é que foi organizado pelo FSB – herdeiro reforçado da polícia política KGB de Stalin – “para estimular o belicismo na Rússia. Este é, para mim, o principal motivo”.

Daria Dugina foi selecionada,  opina Sergej, e as cerimônias, discursos, cobertura da mídia, carros alegóricos oficiais, etc. lhe fazem acreditar que foi orquestrado.

Seu nome apareceu nos tanques russos na Ucrânia escrito até incorretamente, provando que os soldados nem sabiam quem ela era, mas receberam ordens para pintar seu nome.

Para Sergej, Putin acredita em parte no complô ocidental contra a Rússia, após muita autodoutrinação.

Dugin lhe promete algum tipo de força sobrenatural da qual dependia o sucesso ou o fracasso das iniciativas do presidente.

Desde a década de 1990, dentre outras influências, Dugin acreditava no mago e alquimista inglês Aleister Crowley (1875 –1947), também apelidado “Frater Perdurabo” e “The Great Beast 666”.

Crowley foi precursor do movimento hippie, pondo as bases da mistura de liberdade sexual, experiência de todo tipo de drogas, meditação, mistura – nos diríamos ecumênica – de cultos orientais e ocidentais.

Os Beatles incluiriam sua imagem na capa do álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band e os brasileiros Paulo Coelho e Raul Seixas exploram suas estranhas doutrinas.

Dugin acredita conhecer as verdades ocultas que impulsionam a evolução universal, explica Sergej Sumlenny.
E apela a essas leis telúricas da matéria divinizada, aliás, que ele imagina, e postula movimentos fatídicos a quem as pessoas não podem se opor mas, no máximo boiar neles.

Extravagâncias análogas foram postuladas pelo historiador soviético Lev Gumilov (1912 –1992) que excogitou que enquanto a nação tiver um poder apaixonado no governo, ela ficará no topo, e que se perde esse “entusiasmo”, as derrotas acontecem.

Desde tais pontos de vista, o que os indivíduos fazem não importa, são aglomerados de átomos que essas forças cegas impulsionam, transformam ou extinguem.

Escuros fulgores do gênero permeiam a literatura russa e estão profundamente enraizados na igreja ortodoxa russa, hoje mais conhecida como Patriarcado de Moscou, e acentuados pelo recurso permanente ao sacrilégio.

Para Sergej, no pensamento de Dugin o assassinato da filha valeria como um movimento catalisador do espírito russo.

Daria e seu pai falavam muito sobre a morte como solução para canalizar o poder espiritual da alma da nação.

Dugin, explica o jornalista russo, usa o misticismo baseado no culto da morte porque “libera energia”.

Sergej explica que os tomadores de decisão russos são supersticiosos. Vivem acreditando em números, horóscopos, coincidências, inspiração divina, etc.

Se vão à igreja (ortodoxa) não é porque são cristãos, mas porque supõem achar um portal para a bênção das profundidades.

Muitas pessoas na Rússia de grande influência e conhecimento técnico acreditam fortemente em todas as teorias de conspiração possíveis por causa dessas superstições esotéricas, revela o redator da principal revista de economia russa.

O jornalista entrevistado acrescenta que o símbolo “Z” usado na invasão da Ucrânia, segundo Kamil Galeev, do Woodrow Wilson International Center for Scholars, foi forjado à luz destas doutrinas ocultistas. Podendo ser até comparada com a interpretação iniciática da suástica nazista.

A tendência de acreditar em todas as coisas esotéricas possíveis não diminui nas elites em comparação com a “classe baixa”, não iniciada nas doutrinas de Dugin. Por isso, muitos russos acreditam que Putin traz boa sorte.

O site Atlantico pediu ao jornalista aprofundar o que é a “unidade paranormal” do FSB.

Sergej responde acenando com o sigilo dessa “unidade”, mas lembra numa entrevista publicada no jornal oficial do governo em 2006 o general do FSB Boris Ratnikov menciona uma equipe de telepatas que invade a mente dos políticos ocidentais.

“Pessoalmente, acho que eles acreditam que há coisas que podem controlar além deste mundo, se tiverem a chance.

“Conheci FSBs na minha juventude, e eles acreditavam em forças paranormais. Não sei se é por falta de educação ou por ser membro do serviço secreto”.

Sergej acha que essa tendência infernal não pode ser atribuída aos sovietes pois já existia antes da Revolução, basta pensar em Rasputin e sua influência na corte do último czar, Nicolau II.

Mas para ele é claro que esse amor pelo paranormal também é consequência da educação soviética.

E que na tomada de medidas táticas concretas essas crenças podem ter uma enorme influência. Eles prestam atenção à numerologia.

Por exemplo, as datas para as invasões em grande escala na Geórgia 8/8/08 e de Ucrânia, 22/02/2022, foram escolhidas pela repetição dos números.

Na invasão da Ucrânia, acrescentou o entrevistado, as iniciativas foram influenciadas por essas crenças.

“Eles dizem: ‘se essas forças ocultas existem, por que não tentar canalizá-las?'”, conclui Sergej Sumlenny. E o fato é que o demônio existe.

 

Luis Dufaur, escritor, edita, entre outros, o blog Flagelo Russo, no qual o presente artigo foi publicado originalmente.

 

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