A nova-velha reductio ad fascistum
Por Felipe Melo - Arquivo MSM
Aristóteles, na seminal obra “Retórica”, aponta três aspectos que se pode explorar na retórica para atrair a simpatia das pessoas e convencê-las acerca da retidão de sua argumentação: o logos, que se relaciona com a lógica dos argumentos apresentados; o ethos, que consiste em transmitir, durante a argumentação, a impressão de se ser uma pessoa boa, inteligente e arguta – o que se chamava antigamente de “homem virtuoso”; e, por fim, o pathos, que é a exploração dos sentimentos através do discurso. Claro que para Aristóteles esses três aspectos não deviam ser utilizados para enganar as pessoas de modo a convencê-las de coisas mentirosas, pois isso seria um papel indigno feito por sofistas e charlatães. Schopenhauer tratou de diversas técnicas de engabelação pseudo-intelectual em seu livro sobre dialética erística.
No entanto, nem Aristóteles nem Schopenhaer viveram o suficiente para ver surgir um dos mais freqüentes e nauseabundos expedientes utilizados exaustivamente pela mais vasta classe de apedeutas e empulhadores ideológicos: a reductio ad fascistum – uma versão bastante particular da reductio ad Hitlerum (expressão cunhada por Leo Strauss) e da Lei de Godwin. A Lei de Godwin diz: “À medida que uma discussão se torna mais longa, a probabilidade de uma comparação envolvendo Hitler e os nazistas se aproxima de 1”. No entanto, a reductio ad fascistum possui uma peculiaridade incrível: ela prescinde de qualquer discussão. O único pré-requisito necessário é que o alvo da reductio ad fascistum adote qualquer comportamento ou defenda qualquer ideia que não esteja devidamente salvaguardada pela cartilha do politicamente correto, do credo progressista ou dos dogmas marxistas.
Um exemplo clássico do uso exaustivo da reductio ad fascistum é o Dr. Bagno, citado no nosso artigo anterior. O Dr. Bagno, como já foi dito, não conhece o que defendemos, os valores pelos quais lutamos, os autores que lemos, as ideias que divulgamos… Ele é absolutamente ignorante quanto a essas coisas. No entanto, o Dr. Bagno pôs na cabeça que somos fascistas! O motivo disso? Somos declaradamente conservadores. Na cabeça de pessoas como o Dr. Bagno, pessoas conservadoras – aquelas que acreditam na imperfectibilidade humana, em uma ordem moral superior, na impossibilidade de instaurar um Paraíso Terreno (libertino, coletivista ou ambos), na existência de uma natureza humana – são automaticamente fascistas – acreditam num Homem Novo, na derrocada dos valores tradicionais e sua substituição por valores adversos, no coletivismo, no Estado-Deus.
É possível conjeturar se o Dr. Bagno sequer ouviu falar de autores como Leo Strauss, Peter Kreeft, Paul Johnson, Russell Kirk, T. S. Eliot, Roger Scruton, Josef Pieper, Étienne Gilson, Mortimer Adler, Erik von Kuehnelt-Leddihn, Alasdair MacIntyre e outros tantos – citando apenas pensadores dos últimos 100 anos. Se isso se dá com esses grandes nomes do pensamento humano recente, é quase impossível pedir que conheça Edmund Burke, Alexander Hamilton, Alexis de Tocqueville, Frédéric Bastiat, Lorde Acton, Adam Smith, Samuel Johnson, toda uma tradição de ideias que remontam à própria Grécia antiga e que, em maior ou menos grau, influencia o pensamento conservador. Não, não, não! Se eu tenho Noam Chomsky e Michel Foucault à mão, para que olhar para toda essa velharia reacionária, não é mesmo?
Preconiza um antigo ditado semita o seguinte: “Um tolo joga uma pedra em um poço e mil sábios não conseguem removê-la.” Esse ditado guarda uma verdade inconteste: é muito mais trabalhoso explicar uma falácia que já é tomada como realidade do que transformar em realidade uma falácia. De pouco adiantaria explicar que essa conexão entre conservadorismo e fascismo foi urdida por Stalin – um dos maiores genocidas da história humana – como tática de agitação e propaganda, que essa mentira tem sido repisada há décadas, que ela se entranhou no imaginário popular graças à sua utilização ad nauseam pelas abundantes tropas de choque marxistas. A única coisa possível de se fazer é rir da tolice e da ignorância dessas pessoas, pois a reductio ad fascistum é apenas uma forma de se tentar encerrar qualquer debate por medo de ser desmascarado.
Em tempo: o incansável Conde Loppeux de la Villanueva publicou um texto excepcional a respeito do Dr. Bagno. Recomendamos fortemente a leitura de “Marcos Bagno, o Lyssenko da linguística brasileira”!
Felipe Melo edita o blog da Juventude Conservadora da UnB.
Arquivo MSM
Publicado em 15 de dezembro de 2012.