Marx e seu legado de horrores
Por Ipojuca Pontes.
As revoluções ocorridas nos últimos 100 anos jamais se deram, conforme previsto por Marx, pelo desenvolvimento das “contradições internas do capitalismo” e menos ainda pela força do “determinismo histórico”.
No momento em que escrevo estas notas, o Produto Interno Bruto brasileiro está sendo avaliado em mais R$ 3 trilhões (à margem o que se opera na sábia economia paralela), 38% dos quais vão diretamente para os cofres do governo e são torrados, em sua quase totalidade, em grossos salários e aposentadorias, propaganda, subsídios e patrocínios, viagens incessantes locais e internacionais, verbas de representação, festas, almoços, jantares, manutenção e custeio da amplíssima máquina burocrática, propinas, doações a fundo perdido, além de mordomias múltiplas – para não falar nas bilionárias e permanentes falcatruas das agências, bancos, ministérios e institutos oficiais.
A justificativa encontrada pela elite política e administrativa do país para gastos tão alarmantes quanto inúteis são os imperativos de se obedecer aos dispositivos constitucionais, traçados pela própria elite, e que impõem um simulacro de deveres para com o “social” – fraude lastreada, na atual temporada, pelo ardiloso programa do Bolsa Família. De fato, aos olhos de todos (se não estiverem tapados), na medida em que crescem de forma galopante as escorchantes tributações sobre os bens e ganhos privados, dos trabalhadores e dos empresários, aumenta o número de “excluídos”, pois uma coisa decorre exatamente da outra: é o “Estado forte” (com suas “empenhadas” elites partidárias e instituições burocráticas em geral) que se apropria, por força da violência legal (e da inércia ou ignorância da população), da riqueza produzida pela sociedade para usufruto diuturno de privilégios.
A grande e inominável sacanagem que a elite política (à esquerda e à “direita”) comete contra o povo brasileiro consiste em não esclarecer alto e bom som quanto à absoluta incapacidade do Estado em solucionar o problema da pobreza e de não o alertar para o fato de que a existência do Estado se fundamenta, por principio, na exploração e escravização da sociedade (daí, a extrema necessidade de tê-lo sob o controle do indivíduo).
Pode-se afirmar, como Hegel, um professor universitário imaginoso e bem-remunerado, que o Estado representa a realidade racional do Espírito absoluto, ou tolerá-lo, no dizer de Roberto Campos, como um mal necessário. Mas, de um modo ou de outro, as medidas paliativas que em seu nome se alardeia, aqui e acolá, bem como as benfeitorias, no campo social, que a toda hora se inventa e proclama – são elas próprias a evidência do malogro.
E aqui entra, mais uma vez, o pensamento de Marx (e afins). Vociferando contra as forças produtivas da sociedade historicamente sedimentada na propriedade privada, na confiança e na solidariedade que os homens cultivam para sobreviver, o irado profeta da trombeta vermelha, por força de um caráter absolutamente egoísta e deformado, fortaleceu como nenhum outro intelectual moderno o mito do Estado (especialmente ditatorial) como instrumento para se chegar à igualdade e à justiça social. Com sua diabólica vocação para vender ilusões e promover discórdias, expressão de injustificada revolta contra uma realidade espiritual transcendente que jamais chegou a entender, ele de fato ajudou (e continua ajudando com a mística do comunismo) a erguer sociedades perfeitamente escravocratas e desiguais, mantidas ora pela mentira e pelo genocídio, ora pelo medo e pelo terror.
Ao cabo de tudo devemos nos indagar sobre a verdadeira razão do prestigio do marxismo na América Latina, levando-se em consideração que as revoluções ocorridas nos últimos 100 anos jamais se deram, conforme previsto por Marx, pelo desenvolvimento das “contradições internas do capitalismo” e menos ainda pela força do “determinismo Histórico”.
Em parte, a pergunta encontra resposta na já mencionada luta campal que grupos, partidos e corporações travam pelo poder, usando como instrumental as mais fantasiosas teorias para legitimar a exploração do trabalho da maioria – o que significa dizer, em última análise, a exploração da riqueza criada pelo trabalhador e pelo empresário por uma minoria ativa de políticos, corporações e tecnoburocratas que usam o Estado (e seu aparato de violência legal) para impor suas vontades e garantir seus privilégios.
No que se refere à outra parte da resposta, tenho dúvidas quanto à capacidade da maioria em enxergar o óbvio ululante, pelo menos até que sinta na própria carne – a exemplo do que ocorreu na ex-URSS e ocorre hoje em Cuba, Coréia do Norte, Vietnã e China – a tirania da nomenclatura em nome da Ditadura do Proletariado – o que, bem avaliado, no Brasil de hoje é um projeto que navega firme e a todo vapor.
Ipojuca Pontes, cineasta, jornalista, e autor de livros como ‘A Era Lula‘, ‘Cultura e Desenvolvimento‘ e ‘Politicamente Corretíssimos’, é um dos mais antigos colunistas do Mídia Sem Máscara. Também é conferencista e foi secretário Nacional da Cultura.
Arquivo MSM. Publicado em 27 de dezembro de 2010.