Idéias políticas perigosas e a derrocada moral do jornalismo no Brasil

Por Percival Puggina

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Foto: Relatório do Departamento de Justiça dos EUA denunciou, meses atrás, que o governo comunista chinês, por meio do jornal China Daily, pagou grandes jornais ocidentais para publicarem material que era pura propaganda do regime totalitário que domina a China. Entre os jornais citados, estava a Folha de São Paulo, o Correio Braziliense, o The New York Times e o Washington Post.

 

Não se brinca com a natureza humana.

Por que motivo, tantas vezes tomadas como inspiração no acesso ao poder e ali chegadas numa corrente de esperança, resultam em fracassos éticos, políticos, econômicos e sociais?  Qual seu erro essencial?

O erro essencial constatável nestes casos envolve a natureza humana. É um erro antropológico, sobre quem somos. Aquele que vai lidar com política ou outras ciências sociais, mas principalmente expor ideias e apresentar propostas para a organização da vida em sociedade, precisa conhecer o homem e sua natureza porque ele é o ente indispensável a partir do qual e com o qual se constrói o pensamento e a ação política. Ao desconhecê-lo, ao subestimá-lo, ao ver o ser humano apenas como um simples animal racional, ou como uma insignificância no conjunto da sociedade, proclama-se a tragédia por vir. Pelo viés oposto, ao superestimá-lo, tendo-o como deus de si mesmo, cometem-se erros tão terríveis quanto os que já foram praticados a partir de tais equívocos.

Somos seres complexos. Convivem em nós múltiplas dualidades e antagonismos internos inerentes à nossa existência.:

– somos materiais e espirituais;

– somos individuais e sociais;

– somos racionais, intuitivos e emocionais;

– somos capazes do bem e do mal.

E, ainda:

– somos sujeitos da história e objetos da história;

– somos imperfeitos e aperfeiçoáveis;

– estamos vivos e sabemos que vamos morrer;

Muito mais poderia ser dito com igual sentido. De nada vale preferir que fôssemos diferentes; é assim que somos e é assim que nos defrontamos cotidianamente com as tensões inerentes a tais características.

Portanto, toda ordem social que desconhecer as realidades acima não estará apenas predestinada ao insucesso. Estará condenada a se tonar um flagelo, uma tragédia com inscrição funesta nos anais da história.

Não se brinca com a natureza humana. Não se pode descartar de uma cultura, ou de uma civilização, a fé inerente àqueles que nela se integram. Não se pode fazer isso com todos, nem com ninguém. Tal afirmação nos transporta, pela mão, para o caráter simultaneamente individual e social do ser humano.

O dito erro antropológico está presente tanto no individualismo exacerbado quanto no coletivismo exacerbado porque ambas as dimensões são implícitas à nossa natureza, desde antes do nascimento até depois da morte. Ele marcou os coletivismos nascidos no século XX e continua a influenciar o pensamento e a ação política contemporânea.

Para agravar o cenário, ressurge, remodelado em forma e conteúdo, nas articulações do globalismo efluente neste século XXI, tem cadeira no STF e influencia o pensamento jus-político em nosso país..

* * *

O jornalismo que enterrou a si mesmo em cova rasa

O sucesso das redes sociais e da mídia alternativa se deve, principalmente, ao fracasso ético dos grandes grupos de comunicação do país. Se lessem o que publicam, se assistissem aos próprios programas com olhos de ver e não com olhos de quem dispara contra um alvo, talvez conseguissem compreender o fenômeno a que dão causa.

Enterra a si mesmo em cova rasa, à vista de todos, um jornalismo que silencia perante prisão de jornalistas, constrangimento de veículos e  atos que reprimem a liberdade de opinião e expressão. Envolto em cortina de silêncio, tudo isso está acontecendo no país.

Nuvens escuras da incerteza cobrem os céus da pátria, grandes grupos de comunicação formam nosso mais ativo partido político e compõem bancada ao lado do STF. Menosprezam a liberdade de expressão de seus leitores, tanto quanto os ministros alardeiam como mérito sua permanente empreitada “contramajoritária”. Quem diverge é vilão e toda divergência é vilania.

Esgotam sobre os próprios leitores o vocabulário, os rótulos e os chavões que servem como carteira de identidade do grupo que foi varrido do poder em 2018.

Aliás, nada é tão parecido com um discurso da tropa de choque petista quanto o conteúdo de outrora expressivos meios de comunicação.

Eu me criei lendo jornais com enorme tiragem e elevada credibilidade, cujo conteúdo era enriquecido por opiniões competentes e textos de brilhantes escritores. Hoje, fico entre o riso e a tristeza ao perceber a unânime atenção, o apoio e a fidedignidade que lhes merecem atores bufos da cena política, como os senadores ficha-suja que encabeçam a CPI da Covid e ameaçadores ministros que nem mutuamente se respeitam.

Hoje, fico entre o riso e a tristeza, repito, ao ver como veículos outrora altivos e independentes cortejam o cesarismo togado da Suprema Corte. E nisso persistem, mesmo quando ela dilacera a Constituição, mesmo quando faz “justiça” com as próprias mãos e mesmo que suas convicções durem tanto quanto sirva às estratégias.

Viram, há pouco dias, as praças coloridas com as bandeiras da pátria comum, ocupadas pacificamente por famílias, idosos, pais, filhos, jovens. Ouvem-nos cantar hinos cívicos e rezar pelo bem do país.

Esse bom povo brasileiro esteve ali, com seus apelos e seus cartazes, porque ainda preserva a crença de que a democracia tem ouvidos para ouvir.

Esse povo sabe que as instituições são “da democracia”, a ela devem servir, mas não são, em si mesmas, “a democracia”.

Por sua militância porém, veículos que eram oráculos de nossos pais a tudo retratam com as cores da irracionalidade, do desprezo e do ódio. Dão mais guarida ao fascismo dos antifas do que à civilizada manifestação dos conservadores!

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Na Coreia Do Norte também é assim

Li no jornal O Estado de São Paulo dias atrás (03/8):,

“Investigado em dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal, por acusação de interferência política na Polícia Federal e por suspeita de prevaricação diante de denúncias de corrupção na compra de vacinas, o presidente Jair Bolsonaro agora é alvo direto do Tribunal Superior Eleitoral, e não uma, mas duas vezes. Sem falar da CPI da Covid…”

Parei por aí com o saudável intuito de zelar pelo meu bem próprio estar físico, mental e espiritual.

Observe a estratégia usada pela pessoa que criou a matéria e veja como conteúdos dessa natureza se propagam entre os veículos em múltiplos círculos concêntricos que se interpenetram criando um ambiente social depressivo e nebuloso.

Não acho bom, mas não me oponho a que os grandes grupos de comunicação, ou seus jornalistas, divulguem o que bem entenderem, cuidem de seus próprios interesses, disseminem suas ideias e persigam seus propósitos políticos. Cabe ao público fazer o próprio cardápio informativo e analítico, com liberdade de escolha. A situação sai dos devidos eixos, porém, quando conteúdos divergentes passam, como está acontecendo entre nós, a ser tratados como criminosos e se tornam objeto de censura.

Observe que o trecho da matéria do Estadão transcrita acima relaciona meras acusações lançadas contra o presidente com o destampado intuito de “acusá-lo” de ser acusado!

Já me disseram que na Coreia do Norte também é assim.

 

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário, escritor, colunista de dezenas de jornais e titular do site www.puggina.org, no qual os presentes comentários foram publicados originalmente. Autor dos livros ‘Crônicas contra o totalitarismo’; ‘Cuba, a tragédia da utopia’; ‘Pombas e Gaviões’e ‘A Tomada do Brasil’. Integrante do grupo Pensar+.

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