Globalismo e Bioética: a desumanização dos serviços públicos de saúde

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Por Ilza Sousa e Adriana Martel Poggi.

Alfie Evans corre o risco de ter o mesmo destino trágico de Charlie Gard.

“A vida que professar será para benefício dos doentes e para o meu próprio bem, nunca para prejuízo deles ou com malévolos propósitos. Mesmo instado, não darei droga mortífera nem a aconselharei; também não darei pessário abortivo às mulheres’’.
Juramento de Hipócrates

A pergunta que fazem: Por que tratar um doente dispendioso se é possível matá-lo?
Quantas vezes, no Brasil e no mundo, sob o jugo de um sistema unificado de Saúde, nos deparamos com hospitais mal geridos e postos de saúde burocratizados e sem estrutura, nos quais a medicina é colocada sob provas extremas? Quantas vezes, nas últimas décadas, não nos defrontamos com situações limítrofes, nas quais a dor causada pelo indiferença criminosa e pelos e maus tratos, notórios pela evidente negligência do Estado, se contrapoem aos princípios inspiradores de Hipócrates, o pai da medicina ocidental? Quantas vezes, no decorrer destes sombrios anos que marcam a escalada do socialismo, assistimos a morte ser exaltada em detrimento da vida, por parte de defensores de supostos “direitos humanos”, por meio de cânticos carregados de traição àqueles a quem juram salvaguardar e proteger?

Densas razões estratégicas de longo prazo
É a demografia, estúpido, a única questão importante. A Europa no final do século será um continente depois da bomba de nêutron. As grandes construções ainda estarão lá, mas as pessoas que as fizeram terão desaparecido”.
Mark Steyn, analista político canadense.

O National Health Service (NHS), o sistema de saúde britânico, maior sistema público de saúde e o mais antigo do mundo, é designado pelos globalistas como ‘’a solução da saúde para o mundo’’. Implantado no Reino Unido, Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte, chegou a ser homenageado de forma enigmática na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Londres, no verão de 2012.  Ele forma a base dos cuidados médicos do Reino Unido. É interessante observar que os NHS foram criados por legislações separadas e começaram a funcionar em 5 de julho de 1948, logo após a Segunda Guerra Mundial. Seu slogan é : “Somos o Número Um”. ( “NHS ranked ‘number one’ health system”). Conforme o atual secretário de saúde da Inglaterra, Jeremy Hunt, “é motivo de orgulho e seu modelo é “classificado como o melhor sistema de saúde dentre 11 países ricos”. Para Hunt, “esse resultado excelente é um testemunho da dedicação da equipe do NHS. ”

Embora a propaganda estatal enalteça o sistema NHS, os fatos recentes demonstram claramente uma outra realidade, gritantemente invertida.

Apesar dos efusivos elogios vindos das mídias, o sistema não se sustenta, e financeiramente o NHS está um caos. Doentes graves acumulam-se em filas intermináveis sem receber tratamento. Em certa ocasião, Paul Corriggnan, secretário do então primeiro-ministro da Inglaterra, Tony Blair, declarou que para o NHS corrigir  seus problemas agudos no tratamento de doenças crônicas, teria que contratar serviços externos, algo tão grandioso (ou seja impossível), segundo ele, e que seria notado por todos. Sem recursos suficientes, os tratamentos não estão sendo  realizados. Uma suposta correção para o problema, que foi a pauta de intensas discussões, e que parece ter sido implementada, foi disposta por meio três ações necessárias. Primeira, financiamento; segunda: hospitais eficientes e dedicados a tratar especialidades; terceira, e a mais crítica: reduzir a procura de tratamentos desnecessários, através de uma melhoria da saúde pública unida a cuidados individuais.

Passados quase um ano das supostas soluções apresentadas e perante os casos gritantes dos bebês ingleses (Charlie Gard e Alfie Evans, entre outros, que foram abandonados em hospitais sem receber tratamento algum), a verdade veio à tona.

Ao analisarmos o histórico ocorrido com Charlie Grad, torna-se patente que o NHS optou por reduzir essa “terceira ação”. Sobretudo no sentido de abandonar todo e qualquer investimento em pesquisa, medicina experimental, e o caminho do progresso científico. Por motivos econômicos, optou por designar todos seus doentes crônicos como desnecessários.

Kate Andrews, do Instituto Economic Affairs, expressou, publicamente: “O NHS está longe de ser a inveja do mundo”; “não são apenas aos trabalhadores pobres que recebem cuidados precários; a provisão de cuidados do NHS é igualmente precária para todos, independentemente da renda”.

A verdade é que o Reino Unido tem uma das taxas mais elevadas de mortes evitáveis ​​na Europa Ocidental e dezenas de milhares de vidas poderiam ser salvas a cada ano se os pacientes do NHS em condições graves fossem tratados por sistemas de seguro social de saúde em outros países, ou ainda em cooperação mútua.

A disputa judicial travada pelos pais de Charlie Gard
A batalha judicial entre o hospital britânico do sistema NHS, Great Ormond Street Hospital (GOSH), e os pais do bebê Charlie Gard, morto aos 11 meses de idade, foi amplamente divulgada. Charlie nasceu em 4 de agosto de 2016, e com dois meses de idade precisou de assistência médica. Após ter sido recebido atendido no pronto atendimento, foi transferido ao GOSH em 11 de outubro 2016, de onde somente saiu para ser executado em uma clínica ‘’hospício’’.

Constatou-se que o bebê Gard sofria de uma doença raríssima chamada de depelação mitocondrial, doença degenerativa que provoca a perda da força muscular, crescentes danos cerebrais e ainda sem tratamento comprovado. Com o diagnóstico, os pais buscaram alternativas para o tratamento e em janeiro de 2017, iniciaram uma arrecadação para custear, a terapia by-pass, nos EUA, que possui resultados promissores em casos similares ao de Charlie. Contudo, no exato momento em que o GOSH soube das intenções dos pais, a reação da instituição pública foi terrivelmente contrária. O GOSH, não apenas negou a possibilidade da saída do bebê da instituição, mas recorreu à Justiça, com um pedido de suspensão dos cuidados a Charlie Gard. Solicitou ainda à Suprema Corte Britânica, com o fundamento absurdo de “melhor interesse” do bebê, o desligamento do suporte que lhe mantinha a vida.

A Justiça britânica, através do juiz Nicholas Francis, acolheu o pedido do GOSH e imediatamente retirou dos pais o pátrio poder e entregou a  tutoria do filho à advogada Victoria Butler-Cole, presidente de uma ONG pró-eutanásia. Foi nesse instante que iniciou-se uma luta desesperada para tentar salvar Charlie das garras do Estado e de ativistas jurídicos britânicos pró-eutanásia.

Cenário jurídico que envolveu o bebê Charlie Gard
O cenário jurídico estava cercado de ativistas jurídicos pró-morte, reconhecidos publicamente como defensores da ‘’eutanásia como forma de caridade’’. Aos olhos do mundo, a Suprema Corte britânica, ao retirar o pátrio poder dos pais de Charlie Gard, o entregou a uma advogada, presidente da organização Compassion in Dying, instituição irmã da Dignity in Dying, que está à frente da campanha legal para a morte assistida no Reino Unido. Diante de tamanha perversão do direito, os pró-vida, no mundo inteiro, inclusive os brasileiros, acessaram em massa o perfil oficail do Facebook da Família Real Britânica, cobrando da monarquia inglesa a defesa de seu inocente súdito. O silêncio apontou para diversos significados sombrios sobre o que estava por vir.

O caso foi arrastando-se por meses, e para um bebê que apresentava uma epilepsia grave, foi fatal. Os médicos americanos que desenvolveram o tratamento experimental, somente tiveram acesso a Charlie após 6 meses do  processo jurídico instaurado, o que acabou levando-os a constatar que a saúde do bebê havia se deteriorando muitíssimo. Os pais optaram por desistir da disputa judicial. Mesmo com a intervenção do presidente dos EUA, Donald Trump, do Papa Francisco e a pressão pública mundial, o bebê foi transferido a um hospício e os aparelhos foram desligados sumariamente em 30 de julho de 2017.

Novos casos similares ao Charlie Gard
Ainda em meio a toda essa disputa, apareciam inúmeros casos similares ao do Charlie num sistema de saúde que, em lugar de tratar os doentes, opta, pasmem, pela inatividade até a morte dos pacientes. Um desses doentes graves é o bebê Alfie Evans (foto), hoje com 13 meses de idade.

Alfie começou a sofrer convulsões e epilepsia grave, sintomas similares ao de Charlie Gard. Alfie foi levado a um hospital em Liverpool e para a sorte do bebê, não foi transferido para o Gosh. No hospital, as convulsões pioraram, o bebê foi colocado em um respirador, em virtude de insuficiência respiratória, e agora encontra-se num estado de coma induzido. Contudo, ainda possui capacidade pulmonar. Em dezembro de 2016, o bebê teve uma piora relevante e o hospital avisou que iria retirar o suporte à sua vida. Os pais, é claro, se negaram a aceitar; Porém, como por milagre, o bebê teve uma pequena estabilização e a ideia macabra por enquanto foi deixada de lado.

Sem diagnóstico e sem tratamento
Alfie até hoje, inacreditavelmente, sobretudo para um país desenvolvido e que pretensamente anuncia possuir o maior e o melhor sistema de saúde pública do mundo, não possui um diagnóstico! Está recebendo apenas 5 medicamentos e nenhum tratamento para a sua doença desconhecida – apenas os cuidados paliativos.

Em julho, o hospital indicou a possibilidade de uma ação judicial contra os pais de Alfie. Ou seja, mais um caso de ativismo judicial pró-eutanásia, como o sofrido pelo bebê Charlie Gard,  e de evidente condução jurídica em direção à morte.

O NHS, denominado como “modelo público de saúde de excelência para o mundo”, tem como bandeira não tratar  seus doentes crônicos e ignorar o valor da vida humana. Com esse posicionamento, os casos graves considerados caros são abandonados, e a partir da evolução da doença pela falta de cuidados, o quadro clínico desses pacientes inevitavelmente acaba por  piorar. É aqui que revela-se o real interesse do sistema jurídico pró-morte, quando se alega que o “melhor interesse” do paciente esquecido seja a morte ‘’assistida’’.

O que está obviamente em curso é a implementação da eutanásia passiva, seguida da eutanásia ativa e um de novo “plano de negócios em Saúde“, no qual a vida humana é tratada somente como índice estatístico e de rentabilidade. Isto é, caso se afaste da curva-padrão, deve-se seguir ao plano de descarte e venda associada de órgãos. Aos olhos do mundo, o NHS revela-se não um sistema de saúde, mas um anti-sistema, em que pacientes crônicos são descaracterizados em sua humanidade e violentados os  seus direitos fundamentais.

O controle populacional é um dos grandes objetivos desse milênio anticristão.

“Mas eles me disseram uma vez que Alfie nunca mais abriria os olhos, e ele tem aberto, então eu quero apenas que ele tenha uma chance justa.’’
Tomas Evans, pai de Alfie.

Referências:
http://www.bbc.com/news/health-40608253

https://www.economist.com/news/britain/21706563-nhs-mess-reformers-believe-new-models-health-care-many-pioneered

https://www.thesun.co.uk/news/3248426/charlie-gard-death-parents-legal-fight-family/

http://www.foxnews.com/world/2017/07/27/charlie-gards-disease-and-legal-case-explainer.html

https://www.theguardian.com/uk-news/2017/jul/29/ten-cases-like-charlie-gards-heard-english-courts-this-year

https://www.thesun.co.uk/news/4032425/charlie-gard-lawyer-assisted-dying-charity-campaign/

https://www.theguardian.com/society/2017/aug/12/health-inequality-gap-growing

http://www.dailymail.co.uk/news/article-4726448/Hospital-slams-Charlie-s-doctor-giving-false-hope.html


Ilza Sousa
, engenheira civil e pesquisadora católica pró-vida.
Adriana Martel Poggi, pesquisadora, especialista em Comunicação.

 

Publicado em 6 de setembro de 2017.

 

 

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