Explicando minhas posições

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Por Jeffrey Nyquist, em 24 Março 2005.
Arquivo MSM.

 

Nota editorial: Esta carta de J. R. Nyquist foi escrita em resposta a um leitor adepto do libertarianismo. Resolvemos publicá-la porque ela serve também a muitos leitores que escrevem cobrando posições liberais e/ou libertárias de nossa parte. Embora reconheça a importância do livre mercado e da propriedade privada, Nyquist mostra que essas instituições só existem porque foram criadas e protegidas por outras instituições, anteriores e superiores ao capitalismo laissez-faire, que garantem a segurança e a sobrevivência nacionais. O capitalismo laissez-faire floresceu como resultado do bom funcionamento dessas instituições anteriores, e não porque algum ideólogo de plantão sonhou com o livre mercado e resolveu implantá-lo da noite para o dia. O bom estrategista geopolítico sabe que a segurança nacional está acima do livre coméricio e, se necessário for, deve-se sacrificar este em nome daquele.

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Um leitor canadense enviou-me uma carta discordando de meu último artigo sobre o livro de Steven Vincent. Diz ele que a América tem de sair do Iraque e deixar os iraquianos se virarem sozinhos. À primeira vista, até que parece uma opinião legal, respondi, mas a América foi atacada em 11 de setembro por árabes; e seremos atacados novamente se não fizermos algo para mudar as estruturas do mundo árabe.

Meu correspondente canadense insistiu que o Governo dos EUA “falhou em sua missão principal pela primeira vez [11/9]”. Ele não consegue entender por que os americanos “querem dar [ao Governo] uma segunda chance”.

Evidentemente, não temos escolha, a não ser quando se trata de eleições. O Governo dos EUA é responsável por gerenciar nossas defesas. O eleitorado americano apenas elege aqueles que liderarão o governo.

Você pode concordar ou discordar de meu realismo, mas se a alternativa a George W. Bush era John Kerry, então é Bush na cabeça. Pelo menos ele enfrenta desastres declarando guerra, na tentativa de mudar as estruturas políticas do Oriente Médio. Kerry, por outro lado, defende uma política de apaziguamento (que é, em si e por si, vergonhosa e, no fim das contas, desastrosa). Não sei se o presidente Bush tomou a decisão estratégica correta ao invadir o Iraque. Tenho certeza que há um monte de generais por aí cheios de conselhos raivosos para dar, como sempre. Como eu vejo as coisas, Bush é um cara que luta contra os inimigos do país sem remorsos, e entende que a América tem de estar na ofensiva. Não dá para ficar sentado numa boa, dando a esses assassinos o tempo que quiserem para prepararem seu próximo golpe.

Sempre há aqueles que não me entendem. Acusam-me de ser partidário de Bush ou de lamber suas botas. Mas não é disso que estou falando. Para aqueles que vilipendiam o presidente, cheios de críticas ácidas, digo: É errado desejar a derrota da América. (Pois não é nisso que tudo se resume afinal, ao nível emocional?). Todos sabemos o que a extrema esquerda tem a dizer. Mas e quanto àqueles da direita que pintam George W. Bush como o diabo porque ele é “socialista” e a América tornou-se “um país corrupto”? Eis o pensamento que está por trás desse tipo de raciocínio: “vamos enforcar os que traíram o capitalismo laissez-faire”. Embora eu seja a favor do mercado livre e desconfie do assistencialismo estatal, entendo que a política tem primazia sobre a economia pois a segurança nacional e a sobrevivência nacional precisam estar acima dos ganhos financeiros. Os direitos individuais devem ser protegidos, mas não a qualquer custo. É necessário um mecanismo defensivo real, assim como é necessário um senso do dever real por parte daqueles que são chamados a lutar e morrer. E é aqui, neste terreno, que o anarquismo dos libertários encontra sua correção. Não há Estado sem homens armados que lutem por ele, e homens armados só são eficazes e honrosos na medida que seu senso do dever lhes convida a isso. Não é por acaso que o pai deste país era um general. É de suma importância que consideremos esse aspecto como prioritário. A razão do sucesso de nosso sistema político não deve ser encontrada no laissez-faire, mas nas antigas noções romanas de “dever militar”, “Estado de Direito” e “crescimento orgânico das livres instituições”. O laissez-faire que desfrutamos vem de proteções e hábitos nacionais derivados do modelo romano, e não dos sonhos dourados de algum ideólogo. O princípio número um de um bom governo não é o laissez-faire mas um elaborado sistema de pesos e contrapesos que evitem o surgimento de poderes despóticos. Uma boa constituição, em si, levará ao florescimento de uma sociedade onde reine o livre mercado. É isso que tem de ser protegido, mas o mecanismo que o protege não pode ser traído.

Ao invés de lidar com tais questões complexas, as pessoas freqüentemente tendem a usar fórmulas ideológicas. Se elas conseguirem memorizar uns poucos princípios básicos então acham que tudo vai ficar em ordem. E aí elas vão trabalhar e que bela desgraça! Por exemplo, consideremos algumas dessas idéias: Livre comércio é uma coisa boa, mas só se você comercializar com pessoas que não pretendam destruí-lo. Laissez-faire é uma coisa boa, mas só se suas indústrias de base não estiverem sendo compradas por empresas de fachada trabalhando para serviços de inteligência.

Eu apóio o governo dos Estados Unidos porque é o poder mais benevolente do planeta. Além disso, é o governo do meu país, eleito de acordo com a Constituição, e que segue as práticas políticas pertencentes às melhores nações que o mundo já viu. (Desculpe, França.) Uma alternativa ao Governo dos Estados Unidos seria complicada e impraticável, e o resultado provaria ser inferior ao que desfrutamos hoje. Você até pode imaginar, com seus “princípios perfeitos”, transformar os EUA em algo mais laissez-faire, mas (1) os princípios perfeitos da sua cachola não se traduzirão num Estado Ideal; (2) revoluções sempre quebram o encanto que envolve o exercício do poder, levando a matanças em massa; (3) portanto, é melhor você ceder e confiar em George W. Bush e no Tio Sam.

Alguém enviou-me o seguinte comentário após ler meu artigo Bush e a Europa:

“Li (ou dei uma lida) seu artigo com espanto e diversão. Os americanos não são famosos por conhecer o mundo ao seu redor e George W. Bush não é exceção. Dado que a maioria dos cidadãos americanos elegeu Bush nas últimas eleições, em vez de uma decisão da corte suprema como aconteceu em 2000, os estrangeiros têm agora uma idéia bem melhor da psique americana. Bush é um imbecil que não consegue nem mesmo pronunciar “nuclear” (ele fala “nucular”). Nessa era pós-Iraque, é uma decisão perfeitamente racional que qualquer país se arme nuclearmente para defender-se de um ataque americano, por exemplo, caso os EUA queiram algo que lhes interesse, como petróleo. No geral, os EUA não passam de uma bolsa de valores quebrada. O estado de suas finanças mostra que os EUA são uma república de bananas falida com uma administração à altura. Qualquer discurso austero de Bush é risível. Continue o bom trabalho, sr. Bin Laden”.

A mensagem está cheia de lugares-comuns caluniosos com o único objetivo de denegrir. O mais maçante nisso tudo, porém, é ser apedrejado por aqueles que erroneamente acham que adoro George W. Bush – ou que sou um apologista de Bush! E eis aqui o esclarecimento: as idéias de Bush não são as minhas idéias. O fato de eu respeitar o presidente dos Estados Unidos e a Constituição é algo correto e apropriado. Mas não confunda minhas análises, que têm sido delineadas em centenas de artigos e centenas de páginas publicadas. O que vou dizer pode soar bem duro, mas não é verdade que George W. Bush seja o único a almejar o desastre ao invadir o Iraque. Toda a América – como cultura, como povo – tem almejado o desastre há mais de duas décadas. Carter, Reagan, Bush pai, Clinton e o povo americano como um todo, são igualmente culpados pela atual crise.

Os Estados Unidos erraram ao não se prepararem para a próxima guerra mundial. Esse erro continua, mesmo hoje. A América perdeu de vista seu inimigo e o método do seu inimigo (que é ludibriar, enganar). Atualmente, a América está preocupada com criminosos muçulmanos que porventura possam adquirir armas nucleares e biológicas. Detesto contar segredos, mas criminosos comunistas não apenas adquiriram tais armas há mais de cinqüenta anos, como acumularam tal quantidade delas que poderiam destruir os Estados Unidos enquanto país e reduzir sua população a uma fração do que é hoje. E se você acha que os líderes de Moscou e Pequim não pensam em fazer exatamente isso, então você ainda não aprendeu o be-a-bá político. Você pode até se esconder em seu think tank, mas a Rússia possui algumas milhares de armas nucleares, após 15 anos da queda da União Soviética, e acabam de anunciar o desenvolvimento de uma nova geração de ogivas nucleares.

O arsenal russo é tão grande e tão sofisticado que só pode servir para um objetivo: destruir os Estados Unidos. Para reforçar essa idéia, basta lembrar que as lideranças políticas americanas seriam dissuadidas por um ataque nuclear russo caso a Rússia tivesse apenas 100 ogivas nucleares; logo, é seguro afirmar que as 6.000 ogivas nucleares russas não foram construídas para mera dissuasão. E esta é uma das muitas dicas que mostram a atual situação que temos de enfrentar.

A América também insiste em não registrar o fato de que Rússia e China estão patrocinando diversos países repressivos (Coréia do Norte, Irã, Síria, Cuba, Venezuela etc.). A América não reconhece o fato óbvio de que Rússia e China penetraram os Estados Unidos (e seus aliados) economicamente, de tal forma, que compromete seriamente nossa segurança nacional. E há ainda as contribuições que a Rússia dá à escalada militar chinesa – inclusive desenvolvendo avançados sistemas de mísseis navais, submarinos e caças. George W. Bush não atinou para esses fatos e o povo americano não se atinou deles também. Portanto, antes que me acusem de ser seguidor do presidente, é melhor inteirarem-se melhor das minhas concepções estratégicas e as da atual administração.

Dada a natureza da ameaça, como a vejo, não há por quê chamar o presidente de “imbecil”. Alguém que percebe uma ameaça, ou suspeite fortemente de uma ameaça ao país, é obrigado a dizer alguma coisa.

A pessoa a quem dirijo esta mensagem é, em última instância, o presidente dos Estados Unidos e seus assessores. Quero estas questões discutidas e debatidas. E não posso fazer isso escrevendo artigos que sejam ladeados por quem menospreza a atual administração e declare que os Estados Unidos sejam a Alemanha Nazista contemporânea. Tais polêmicas não têm vez no meu trabalho. E aqueles que compartilham de tais opiniões que vão tomar banho.

Tradução: Edward Wolff.

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